Relatório
do relator cria trava para aumento da carga tributária, mas amplia o número de
exceções ao novo regime proposto
Foto: Divulgação - José Maurício Caldeira
A partir da leitura do
relatório do senador Eduardo Braga (MDB-AM) sobre a reforma tributária, as
comissões e o plenário do Senado deverão apresentar sugestões à PEC (Proposta
de Emenda à Constituição), já aprovada pela Câmara dos Deputados. O senador
apresentou o relatório na quarta-feira (25/10) e, após eventuais mudanças o
texto retornará à Câmara, onde será votado novamente pelos deputados. Estão
previstas mudanças profundas no sistema nacional.
A reforma tributária visa simplificar
a tributação no país ao substituir IPI, PIS e Cofins (federais); ICMS
(estadual) e ISS (municipal) por apenas duas contribuições, a CBS (Contribuição
sobre Bens e Serviços, federal) e o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços, para
estados e municípios), que terão alíquota única. Apesar de não estar prevista a
redução da carga tributária, a mudança é grande e deverá causar impacto na
economia brasileira.
“O sistema atual ficou
disfuncional”, diz José Maurício Caldeira, sócio acionista da Asperbras,
que atua em diversos segmentos da indústria e agronegócio. “O emaranhado de impostos
existente hoje representa um custo alto para as empresas, que precisam pagar
serviços especializados nessa área. Para melhorar a competitividade de seus
produtos, o Brasil precisa de um sistema mais moderno e simples, reforça
Caldeira”
Atualmente, há bens que
recebem 27 regimes de tributação de ICMS diferentes, dependendo do estado da
federação. No caso das cobranças municipais, cada um dos mais de 5.000
municípios cria sua própria política de arrecadação, tornando impossível prever
quanto se gasta efetivamente em meio a esse emaranhado de impostos no país.
A unificação prevista na
reforma deve mudar esse quadro. Hoje, uma cadeia produtiva longa, como a
automotiva, recolhe impostos em todas as suas etapas produtivas, que vão se
acumulando, com cobrança sobre cobrança. A partir da reforma, está previsto o
fim da cumulatividade. Não é possível saber hoje, por exemplo, quanto se gasta
na compra de um automóvel novo – a fábrica de pneus paga impostos, a fábrica de
estofados e a própria montadora. Vira uma bola de neve. Isso vai acabar porque
as empresas terão o chamado crédito tributário: vão descontar imposto pago por
aquele produto, pelo seu fornecedor.
O governo e o Congresso vão
calcular uma alíquota única (somados o IBS e a CBS) que mantenha o patamar de carga
tributária que existe hoje no Brasil. A previsão é de que ela fique entre 25% e
27%. Outra mudança importante é o local do recolhimento dos tributos. Hoje, é
feito onde o produto é fabricado, favorecendo os grandes centros. Depois que a
reforma tributária for aprovada, será cobrado no local onde o produto é
vendido. Com isso, terá fim a chamada guerra fiscal, em que cada estado busca
reduzir alíquotas para atrair fábricas e empresas. José Maurício Caldeira
concorda que essa mudança promoverá mais igualdade, com o valor arrecadado
permanecendo no local onde o produto foi consumido, da mesma forma que ocorre
em 90% dos países.
Exceções
da reforma
Apesar de ter sido bem
recepcionado nos meios político e econômico, o relatório do senador Eduardo
Braga também foi alvo de crítica de alguns economistas, que consideram
excessivo o número de exceções ao regime tributário único acrescentadas ao
texto pelo relator, além daquelas incluídas na Câmara. Profissionais liberais,
como advogados e médicos, pagarão o correspondente a 70% da alíquota cheia. A
Cide, que é um imposto sobre combustíveis, vai ser usada para incidir sobre
todos os produtos importados e comercializados no Brasil que concorram com a
Zona Franca de Manaus. Com isso, a Zona Franca passa a ter duas proteções: a de
continuar pagando menos impostos e essa tributação adicional sobre a
concorrência.
Na avaliação de José Maurício
Caldeira, da Asperbras, também ocorreram acréscimos positivos ao projeto. “O
estabelecimento de uma trava para os novos impostos, com um teto de referência
com base na arrecadação média do setor público entre 2012 e 2021 em relação ao
PIB, é uma boa medida”, analisa Caldeira. “Ela é importante para impedir um
aumento ainda maior da carga tributária”, destaca. O empresário lembra ainda
que o comitê gestor do imposto unificado de estados e municípios, que pelo
projeto da Câmara teria um aspecto mais político, passará a ser mais técnico,
sob controle do TCU (Tribunal de Contas da União) e respondendo ao Congresso.
Principais
alterações ao texto da reforma
- Após negociações com os
governadores, a equipe econômica concordou em elevar para R$ 60 bilhões anuais
o valor colocado pela União no fundo para os estados – mas só a partir de 2043.
Entre 2034 e 2043, haverá um incremento de R$ 2 bilhões ao ano. O relator
propõe que 70% do fundo siga as mesmas regras usadas hoje para dividir o Fundo
de Participação dos Estados (FPE), que dá mais dinheiro a estados mais pobres;
30% do fundo é distribuído proporcionalmente ao número de habitantes de cada
estado.
- O relator propõe também que
o "Conselho Federativo" – que seria criado para gerenciar o fundo e
poderia tomar decisões – seja na verdade um "Conselho Gestor", sem
ingerência política e com a missão apenas de assegurar a divisão correta dos
recursos.
- O senador inseriu na
proposta um mecanismo de revisão, a cada 5 anos, dos incentivos concedidos a
alguns setores da economia. A discussão sobre segmentos que terão direito a uma
tributação diferenciada é um dos pontos sensíveis da proposta em análise pelo
Congresso.
- A proposta de reforma
tributária aprovada pela Câmara dos Deputados prevê que alguns setores não
precisarão pagar a alíquota geral. As exceções se dividem em três grupos:
cobrança reduzida, equivalente a 40% da chamada "alíquota padrão" que
valerá para os demais setores; alíquota zero, em itens como os da cesta básica,
por exemplo; ou regimes específicos, com formato de cobrança diferenciado, para
setores como o financeiro, o imobiliário e o de combustíveis.
- A nova versão do texto prevê
regime diferenciado para operações alcançadas por tratado ou convenção
internacional, inclusive missões diplomáticas e representações consulares e de
organismos internacionais; serviços de saneamento e de concessão de rodovias;
operações que envolvam a disponibilização da estrutura compartilhada dos
serviços de telecomunicações; serviços de agência de viagem e turismo;
transporte coletivo de passageiros rodoviários intermunicipal e interestadual,
ferroviário, hidroviário e aéreo.
- Alguns setores da economia pagarão 40% da alíquota geral (cobrada de todos os segmentos da economia), que pode chegar a 27% - uma das maiores do mundo.